domingo, fevereiro 13, 2005

Prólogo

que luz, que clarão que é um papel em branco na frente
e um monte de histórias atrás.
feliz da platéia esperando minha genialidade
bem na hora que deu branco.
como será que se chamarão esses versos
sem métrica e sem fim?

quisera saber ler em árabe,
escrever em francês, pensar em inglês,
qualquer língua que me faça esquecer a minha e a sua,
com a qual aprendi a sentir,
mas jamais a pensar e ainda menos a sonhar.
sonhar é mais fácil em alguma língua misteriosa:

invoco a rima, o ritmo e musas bacantes e bacanas.
poesia é só escrever com liberdade.
mentir bonito pode, falar a verdade não.

o que pode é criar, isso dá o que falar.
já pensou que perigo?
ser diferente da maneira que todo mundo espera que eu seja...
que coisa mais suicida e mais igual.
poesia é como tirar a roupa:
na vontade do outro e na saudade do um primeiro.
nada científico, e sim coloquial.

cada palavra é uma valise erudita,
sem alça, pesada, carregada de falta de sentido.
de que vale poder brincar com as palavras?
plantar livros, vídeos, filhos e uma árvore?
isso eu já fiz. posso ir embora?
não, é claro! que isso ainda valha.
e essa maldita veia lírica sem nenhum valor nesse mundo...

fantasia pode, mas só na fantasia.
fantasia fora da cabeça é loucura
e loucuras são duas liras nuas: a veia lírica e a veia trágica.
qualquer boca diz que gosta de poesia e não de loucura.
quando é só uma questão semântica. ou semêntica.
o que brota primeiro?
tem que esperar a árvore crescer pra ver que fruta dá.

bonito se falar em desejo. lembro do Stalker,
onde a promessa do desejo virar realidade = paralisação.
só Tarkowsky se movimenta a 24 quadros por segundo.
realizando meu desejo, nunca soube de mim.
mas seguirei buscando aquele frame de vidro-água,
ventando parada dentro de mim e para sempre impronunciável.
talvez alguma coisa se quebre, talvez nunca.
que coisas ainda há pra rebentar mundo aqui dentro?

deletar: que verbo é esse? que ação é?
deleitar ou ditar, deitar ou datar, dotar ou deter, sim!
mas deletar?
depois sou eu o diletante, o prediletante,
o dilatante, erótico e herético.

um CD no drive é pura holografia de notas musicais.
o todo contido em todo fragmento
objeto lindo, taoísta e colorido.
toda música sempre foi balcânica.
com gente tocando todo tipo de corneta,
batendo todo tipo de tambor,
gente comendo, dançando, cantando, trepando,
brigando, gritando, sofrendo, gemendo, rezando...
messias vai chegar ou vai voltar?
a questão é semântica.

o que nos vale é a espera paralisada
de que o frame primordial se repita.
o todo em todo fragmento.
o vento em still. o aleph.

e ninguém vai ler essa porra toda
a não ser que me vença a vaidade.
além disso o final só pode chegar agora
porque senão ninguém lê até o fim.

e é agora que começa.


Paulo Baroukh 2002/2005
pbaroukh@gmail.com